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A LEI N.12.619, DE 30/04/2012 E A REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO DE MOTORISTA

26/06/2012

A Lei n.12.619, de 30 de abril de 2012, publicada no Diário Oficial da União de 02/05/2012 é uma lei diferente das demais. Ela nasceu de uma grande discussão na sociedade e da carência de ser criar um regramento específico na legislação sobre a profissão do motorista, com direitos e deveres inerentes a sua atividade.

A discussão sobre o pagamento ou não de horas extras para motoristas de caminhões e ônibus é antiga e a jurisprudência sobre a matéria, muitas vezes amparada em certos preconceitos, criou uma insegurança jurídica para patrões e empregados.

A via coletiva para dar tratamento específico para o tema não foi suficiente para solucionar as controvérsias jurídicas existentes.

Dizemos que a Lei 12.619/2012 é especial, pois é fruto de um consenso histórico entre a CNT Confederação Nacional do Transporte e a CNTTT Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres com a participação do Ministério Público do Trabalho, através da Procuradoria Regional do Trabalho da 10ª Região (Brasilia).

E como todo grande entendimento houve concessões recíprocas para que o texto final aprovado pudesse buscar um equilíbrio entre as pretensões das classes econômica e profissional e os interesses da sociedade.

A Lei 12.619/2012 dispõe sobre o exercício da profissão de motorista; altera a CLT e a Lei n.9.503/1997, para regular e disciplinar a jornada de trabalho e o tempo de direção do motorista profissional.

Em razão dos vetos da Senhora Presidente da República ao artigo 12, do Projeto de Lei n.99, de 2007 (n.319/09 no Senado Federal) a nova lei entrou em vigor no último dia 17 de junho (quarenta e cinco dias após a sua publicação), nos termos do artigo , caput, da Lei Complementar n.95, de 26/02/1998 e artigo , do Decreto-Lei n.4.657, de 04/09/1942 (Lei de Introdução ao Código Civil). Também em função dos vetos aos artigos 7º, 8º, 10º e 11º, do PL 99/2007, não houve as pretendidas alterações nas Leis 10.233, de 05/06/2001, 11.079, de 30/12/2004 e 12.023, de 27/08/2009.

Em seu artigo , a Lei 12.619/2012 dispõe ser livre o exercício da profissão de motorista, atendidas as condições e qualificações profissionais nelas estabelecidas, prescrevendo que integram a referida categoria profissional os motoristas de veículos automotores cuja condução exija formação profissional e que exerçam a atividade mediante vínculo empregatício, nas atividades ou categorias econômicas de transporte rodoviário de passageiros e transporte rodoviário de cargas.

Fica claro que a nova lei trata da profissão do motorista com vínculo empregatício na condução de veículos comerciais de transporte de cargas ou de passageiros em estradas pavimentadas ou não ou em vias públicas urbanas.

Considerando que a função de motorista é categoria profissional diferenciada, entendemos que se aplica a referida lei aqueles que atuam em outras categorias econômicas, mesmo tendo havido vetos aos incisos III e IV, do artigo , haja vista a presença de condições de vida singulares e a existência de estatuto profissional próprio, nos termos do par.2º, do artigo 511 da CLT.

De acordo com o artigo , são direitos dos motoristas profissionais, além dos direitos sociais previstos nos artigos a 11 e dos direitos da seguridade social de que tratam os artigos 194 a 204 da Constituição Federal, os seguintes: I- acesso gratuito a programas de formação e aperfeiçoamento profissional, em cooperação com o poder público; II- atendimento profilático, terapêutico e reabilitador, por intermédio do SUS, em relação às enfermidades que mais os acometam, nos termos de levantamento oficial; III- não responder perante o empregador por prejuízo patrimonial decorrente da ação de terceiro, ressalvado o dolo ou a desídia do motorista, nesses casos mediante comprovação, no cumprimento de suas funções; IV- receber proteção do Estado contra ações criminosas que lhes sejam dirigidas no efetivo exercício da profissão; V- jornada de trabalho e tempo de direção, controlados de maneira fidedigna pelo empregador, que poderá valer-se de anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo ou de meios eletrônicos idôneos instalados nos veículos, a critério do empregador; VI- seguro obrigatório, custeado pelo empregador, destinado à cobertura dos riscos pessoais inerentes às suas atividades, no valor mínimo correspondente a 10 (dez) vezes o piso salarial de sua categoria ou em valor superior fixado em convenção ou acordo coletivo de trabalho.

Mister se faz algumas considerações acerca dos direitos elencados no artigo , da Lei n.12.619/2012.

Será necessária norma regulamentadora para definir os critérios de acesso gratuito do motorista profissional a programas de formação e aperfeiçoamento profissional, assim como para o atendimento profilático, terapêutico e reabilitador, através do SUS e as enfermidades que serão consideradas para os referidos tratamentos médicos.

Também deverá ser definido em norma regulamentar ou em instrumentos coletivos de trabalho (acordos ou convenções) os riscos pessoais inerentes às atividades dos motoristas empregados, de cujas coberturas deve tratar o seguro obrigatório criado com a nova lei.

No que tange ao direito mencionado no inciso III, do artigo , da nova lei, vale destacar que nos casos de culpa do motorista, devidamente comprovada, fica autorizada a sua responsabilização, desde que tenha sido acordada formalmente, nos termos do parágrafo 1º, do artigo 462 da CLT. Vale lembrar que a desídia, assim denominada pela doutrina como o descumprimento dos deveres afetos à relação empregatícia, em razão de negligência, de imprudência ou de imperícia do empregado, trata-se de hipótese de justa causa, nos termos da letra e, do artigo 482 consolidado.

A proteção do Estado contra ações criminosas (inciso IV, do artigo 2º) trata-se do direito à segurança pública, já previsto no artigo 144 da Constituição Federal como dever do Estado e direito de todo cidadão. Não há dúvidas que a profissão de motorista, assim como outras não menos relevantes, merece maior atenção do Estado no sentido de oferecer segurança nas estradas e vias urbanas, combatendo o roubo de cargas, uma das chagas do transporte rodoviário que, infelizmente, grassa em todo o país.

No inciso V, do artigo 2º, da nova lei, encontra-se bem delineada a distinção necessária entre a jornada de trabalho e o tempo de direção. A primeira relativa aos motoristas profissionais com vínculo empregatício e o segundo aplicável a todo e qualquer motorista, seja empregado de empresas nacionais ou estrangeiras, bem como ao motorista autônomo de veículos de transporte de cargas ou de passageiros.

Com o advento da nova lei passou a ser obrigação do empregador e um direito do motorista profissional o controle fidedigno da jornada de trabalho por meios eletrônicos idôneos instalados nos veículos ou através de anotação em diário de bordo, papeleta ou ficha de serviço externo.

Desta forma, não há mais possibilidade de se invocar o disposto no inciso I, do artigo 62, da CLT, para o motorista, valendo destacar que o referido dispositivo não foi revogado pela Lei n.12.619/2012, ficando a sua aplicação para outras funções e circunstâncias onde o labor for externo incompatível com a fixação de horário de trabalho, o que não é mais a hipótese do motorista profissional.

Vale destacar que a papeleta de serviço externo possui regulamentação no parágrafo único do artigo 13, da Portaria MTPS 3.626, de 13/11/1991, alterada pela Portaria 41, do Ministério do Trabalho e Emprego, de 28/03/2007.

Também em decorrência do inciso V, do artigo 2º, da referida lei acreditamos que o Tribunal Superior do Trabalho poderá vir a revisar a Orientação Jurisprudencial 322 da SDI-1 que dispõe que o tacógrafo, por si só, sem a existência de outros elementos, não serve para controlar a jornada de trabalho do empregado que exerce a atividade externa.

Como já afirmado, a mencionada lei, em seu artigo 3º, trouxe alterações importantes na CLT, acrescentando os artigos 235-A a 235-H, bem como altera a redação do artigo 71 consolidado, para incluir o parágrafo 5º, de aplicação específica para o transporte coletivo de passageiros.

O artigo 235-B passa a elencar os deveres do motorista profissional que são os seguintes: I- estar atento às condições de segurança do veículo; II- conduzir o veículo com perícia, prudência, zelo e com observância aos princípios de direção defensiva; III- respeitar a legislação de trânsito e, em especial, as normas relativas ao tempo de direção e de descanso; IV- zelar pela carga transportada e pelo veículo; V- colocar-se à disposição dos órgãos públicos de fiscalização na via pública; VI (vetado); VII- submeter-se a teste e a programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica, instituído pelo empregador, com ampla ciência do empregado.

Dispõe ainda o parágrafo único do artigo 235-B que a recusa do empregado em submeter-se ao teste e ao programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica previstos no inciso VII, do mesmo dispositivo, serão consideradas infração disciplinar, passível de penalização nos termos da lei. A redação permite a aplicação de sanções disciplinares e dependendo das circunstâncias o enquadramento no artigo 482, letras b, f ou h, da CLT, sendo evidente que dirigir embriagado ou sob efeito de drogas pode acarretar outras conseqüências de ordem penal, civil e administrativa.

Merece destaque a inclusão no inciso VII, do artigo 235-B, da possibilidade de criação pelas empresas de programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica, medida preventiva de grande alcance social, para que se possa inclusive identificar os casos de dependência.

É certo que a matéria relativa à submissão do empregado a teste e a programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica pode gerar alguma celeuma, mas não se pode obter mais segurança nas estradas e nas vias urbanas, restringindo a aplicação do referido dispositivo legal. Trata-se de hipótese onde o interesse maior da sociedade deve prevalecer sobre o interesse individual.

O artigo 235-C dispõe que a jornada de trabalho do motorista profissional será a estabelecida na Constituição Federal ou mediante instrumentos de acordos ou convenções coletivas de trabalho (oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, nos termos do artigo , inciso XIII, da CF).

Diante das dificuldades em se estabelecer um limite específico para a jornada de trabalho do motorista optou-se pela regra geral, também prevista no artigo 58 da CLT, assim como a permissão de prorrogação da jornada de trabalho por até 2 (duas) horas extraordinárias (par.1º, do artigo 235-C), previsão já contida no artigo 59 consolidado.

A lei estabelece ainda um intervalo mínimo de 1 (uma) hora para refeição, além de intervalo de repouso diário de 11 (onze) horas a cada 24 (vinte e quatro) horas e descanso semanal de 35 (trinta e cinco) horas, nos termos do parágrafo 3º, do artigo 235-C. Em relação aos intervalos inter e intrajornada, nenhuma novidade, pois a CLT já os prevê como regra geral nos artigos 66 e 71. A inovação fica para o repouso semanal de 35 (trinta e cinco) horas, como regra geral para o motorista profissional e de 36 (trinta e seis) horas para aquele que se ativa em viagens de longas distâncias (artigo 235-E, par.1º).

Neste tópico, algumas ponderações são necessárias.

O descanso semanal remunerado de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, preferentemente aos domingos, é um direito do trabalhador, previsto no artigo 67 da CLT e regulamentado pela Lei 605, de 05/01/1949 e Decreto 27.048, de 12/08/1949, com possibilidade de perda da remuneração, quando, sem motivo justificado, o empregado não tiver trabalhado durante toda a semana anterior, cumprindo integralmente o seu horário de trabalho (art. , da Lei 605/1949). Nos termos do artigo , inciso XV, da Constituição Federal, a determinação de que as folgas devem ser aos domingos, salvo motivo de conveniência ou necessidade imperiosa do serviço, não é mais exigível.

Assim, considerando que a Lei 12.619/2012 estendeu, como regra geral, o repouso semanal para os motoristas profissionais para 35 (trinta e cinco) horas e 36 (trinta e seis) horas para aqueles que trabalham em viagens de longas distâncias, tais repousos poderão ou não coincidir com os domingos, valendo destacar que a Portaria 417/66, do Ministério do Trabalho e Emprego, exige que cada empregado usufrua do descanso semanal remunerado de, ao menos, um domingo por mês.

Estabelece ainda o artigo 235-C, em seu parágrafo 4º, que as horas extraordinárias serão pagas com acréscimo estabelecido na Constituição Federal (50%, no mínimo) ou mediante instrumentos de acordos ou convenções coletivas de trabalho, aplicando o adicional de 20% sobre a remuneração para o trabalho noturno (par.5º do mesmo dispositivo).

Em seu parágrafo 6º o artigo 235-C trata de um acordo de compensação de horas onde o excesso de horas de trabalho em um dia poderá ser compensado, pela correspondente diminuição em outro dia, desde que haja previsão em acordos ou convenções coletivas, observadas as regras previstas na CLT. Vale destacar que o artigo 59, parágrafo 2º da CLT, com a redação dada pela Lei n.9.601/1998, institui o chamado banco de horas, cujas regras deverão ser aplicadas à compensação de que trata o parágrafo 6º, do artigo 235-C, bem como as disposições contidas na Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho.

O parágrafo 2º do artigo 235-C traz uma importante inovação na CLT aos dispor que será considerado como trabalho efetivo o tempo que o motorista estiver à disposição do empregador, excluídos os intervalos para refeição, repouso, espera e descanso.

Em relação aos períodos de refeição, repouso e descanso, nenhuma novidade, posto que a própria CLT já os considera como não computados na jornada de trabalho. A grande inovação trazida pela nova lei está na figura do tempo de espera, assim definido no parágrafo 8º, do referido artigo, como sendo as horas que excederem à jornada normal de trabalho do motorista de transporte rodoviário de cargas que ficar aguardando para carga e descarga do veículo no embarcador ou destinatário ou para fiscalização da mercadoria transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias, não sendo computadas como horas extraordinárias.

O tempo de espera não computado na jornada normal de trabalho encontra-se em consonância com a regra geral contida na CLT, em seu artigo , de que se considera como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada. Tal exceção, expressamente consignada no novo artigo 235-C, em seu parágrafo 8º, aplicada ao motorista que atua no transporte rodoviário de cargas, veio ao encontro da necessidade de se estabelecer um regramento para uma situação muito peculiar da atividade que são as horas de espera para carregamento e descarregamento dos veículos em embarcadores e destinatários das mercadorias, bem como em barreiras fiscais e alfandegárias. Vale destacar que o parágrafo 8º, do artigo 235-C, estabelece que são consideradas tempo de espera as horas que excederem à jornada normal de trabalho, ou seja, trata-se de situação peculiar com previsão específica na lei e que deve ter tratamento de exceção, ou seja, somente devem ser assim consideradas as horas além do horário normal de trabalho.

Da leitura do referido dispositivo não vislumbramos a obrigação da empresa pagar primeiramente as duas horas extras máximas diárias para somente após vir a ser considerado o tempo de espera. Desde que sejam respeitados os intervalos inter e intrajornadas e configuradas as hipóteses de ocorrência previstas no par.8º, do artigo 235-C, as horas que excederem a jornada normal poderão ser consideradas como tempo de espera.

Dispõe ainda o parágrafo 9º, do artigo 235-C, que as horas relativas ao período do tempo de espera serão indenizadas com base no salário-hora normal acrescido de 30% (trinta por cento), ou seja, tal pagamento não repercutirá em nenhuma outra verba trabalhista ou previdenciária, haja vista a sua nítida natureza jurídica indenizatória, haja vista que a lei não possui expressões inúteis.

O tempo de espera é a grande novidade trazida para a CLT, pela Lei 12.619/2012, baseada em experiência de outros países, visando dar tratamento diferenciado ao motorista profissional em função das características próprias de sua atividade. Frise-se que a CLT contém previsões específicas para determinadas atividades, no Título III, Capitulo I, ao tratar das disposições especiais sobre duração e condições de trabalho, com destaque para a Seção V, que trata do serviço ferroviário (arts. 236 a 247) onde há previsão de prorrogação do trabalho em até 12 (doze) horas (art. 239), repouso intrajornada de 10 (dez) horas (arts. 239, par.1º e 243) com regimes de sobreaviso e de prontidão (art. 244) e a Seção VI, que trata das equipagens das embarcações da Marinha Mercante, Navegação Fluvial e Lacustre e do Tráfego nos Portos e da Pesca (arts. 248 a 252).

Todavia, em que pese a nova lei dispor que o tempo de espera do motorista profissional não se computa na jornada de trabalho e deve ser indenizado (sem demais repercussões) com base no salário-hora normal acrescido de 30% (trinta por cento), recomenda-se que não haja abusos ou desvirtuamento na aplicação prática desse instituto, não sendo possível aplicá-lo no lugar dos repousos ou em períodos de descanso do trabalhador ou, ainda, em hipóteses não previstas pela lei, haja vista que a sua interpretação deve respeitar os princípios da razoabilidade e da boa fé.

A Lei 12.619/2012, ao inserir na CLT o artigo 235-D, dá um tratamento diferenciado para quem labora em viagens de longa distância, assim consideradas aquelas em que o motorista profissional permanece fora da base da empresa, matriz ou filial e de sua residência por mais de 24 (vinte e quatro) horas, devendo ser observadas as seguintes diretrizes: I- intervalo mínimo de 30 (trinta) minutos para descanso a cada 4 (quatro) horas de tempo ininterrupto de direção, podendo ser fracionados o tempo de direção e o de intervalo de descanso, desde que não completadas as 4 (quatro) horas ininterruptas de direção; II- intervalo mínimo de 1 (uma) hora para refeição, podendo coincidir ou não com o intervalo de descanso do inciso I; III- repouso diário do motorista obrigatoriamente com o veículo estacionado, podendo ser feito em cabine leito do veículo ou em alojamento do empregador, do contratante do transporte, do embarcador ou do destinatário ou em hotel, ressalvada a hipótese da direção em dupla de motoristas prevista no par.6º, do artigo 235-E.

Especificamente para o transporte rodoviário de cargas em longas distâncias o artigo 235-E estabelece que, além das regras previstas no artigo 235-D, anteriormente mencionadas, devem ser obedecidos os seguintes repousos: a) nas viagens com duração superior a uma semana, o descanso semanal será de 36 (trinta e seis) horas de repouso por semana trabalhada ou fração semanal trabalhada, podendo o gozo ocorrer no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou em seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido descanso; b) permissão do fracionamento do descanso semanal em 30 (trinta) horas mais 6 (seis) horas a serem cumpridas na mesma semana e em continuidade de um período de repouso diário; c) dispensa do serviço para o motorista que ficar fora da base da empresa com o veículo parado por tempo superior à jornada normal de trabalho, exceto se for exigida permanência junto ao veículo, hipótese em que o tempo excedente à jornada será considerado de espera; d) nas fiscalizações em barreiras ou aduanas de fronteira, o tempo parado que exceder a jornada normal será computado como tempo de espera e será indenizado na razão de 30% (trinta por cento) sobre o salário-hora normal; e) em casos de força maior, devidamente comprovado, permissão de excedimento da jornada de trabalho do motorista profissional pelo tempo necessário para sair da situação extraordinária e chegar a um local seguro ou ao seu destino; f) jornada de 12 (doze) horas de trabalho por 36 (trinta e seis) horas de descanso, em razão da especificidade do transporte, de sazonalidade ou de característica que o justifique, desde que prevista em convenção ou acordo coletivo de trabalho; g) remuneração de 30% sobre a hora normal ao motorista que viajar em dupla no mesmo veículo, em relação ao tempo em que estiver de repouso no veículo em movimento, observado o repouso mínimo de 6 (seis) horas consecutivas fora do veiculo em alojamento externo, se na cabine leito, com o veículo estacionado; h) proibição de remuneração do motorista em função da distância percorrida, do tempo de viagem e/ou da natureza e quantidade de produtos transportados, inclusive mediante comissão ou qualquer outro tipo de vantagem, se essa remuneração ou comissionamento comprometer a segurança rodoviária ou da coletividade ou possibilitar violação às normas da CLT; i) possibilidade de regulamentação de jornadas especiais, remuneração, benefícios, atividades acessórias e demais condições de trabalho através de acordos e convenções coletivas de trabalho, desde que não sejam prejudiciais à saúde e à segurança do trabalhador.

Assim como o tempo de espera representa uma novidade trazida com a nova lei, o legislador criou a figura do tempo de reserva, assim entendido como sendo o tempo de repouso dos motoristas que trabalham em dupla, se revezando na direção do caminhão. Diferentemente do tempo de espera onde os 30% (trinta por cento) sobre a hora normal são indenizados, no tempo de reserva a hora normal é remunerada em 30% (trinta por cento).

A figura do tempo de reserva também é aplicável ao transporte de passageiros de longa distância em regime de revezamento, nos termos do parágrafo 12º, do artigo 235-E.

Embora a Lei 12.619/2012 trate da profissão de motorista é curioso observar que o parágrafo 10º, do artigo 235-E, aduz que não será considerado como jornada de trabalho nem ensejará o pagamento de qualquer remuneração o período em que o motorista ou o ajudante ficarem espontaneamente no veículo usufruindo do intervalo de repouso diário ou durante o gozo de seus intervalos intrajornadas. A menção ao ajudante se justifica, pois não raro o motorista de viagens de longas distâncias se faz acompanhar de um ajudante de carga e descarga, sendo certo que, nessas circunstâncias, esse trabalhador está submetido às mesmas situações peculiares da atividade profissional do condutor, pelo que também a ele podem ser aplicadas, por analogia, algumas regras contidas na nova lei, como por exemplo, o tempo de espera.

Outra importante inovação trazida pela nova lei é a contida no parágrafo 11, do artigo 235-E que regula a situação muito comum na região norte do país, onde os veículos de transportes são conduzidos através de embarcações fluviais. Nesses casos, desde que a embarcação disponha de alojamento para gozo do intervalo de repouso diário previsto no parágrafo 3º, do artigo 235-C (intervalo de 1 hora para refeição e 11 horas a cada 24 horas), esse tempo não será considerado como jornada de trabalho, a não ser o tempo restante, que será considerado de espera.

Sobreleva ressaltar que a nova lei prestigia a negociação coletiva como forma supletiva de regulamentação de algumas condições de trabalho específicas para determinadas especialidades de transporte rodoviário de cargas. Nesse passo, vale destacar os seguintes dispositivos que mencionam a opção de acordo ou convenção coletiva de trabalho: artigo 2º, parágrafo único (ampliação do valor mínimo da cobertura do seguro obrigatório); artigo 235-C, caput (jornada diária de trabalho); artigo 235-C, par.4º (ampliação do adicional de horas extras); artigo 235-C, par.6º (acordo de compensação de horas); artigo 235-F (jornada de 12X36); artigo 235-H (outras condições específicas de trabalho, desde que não prejudiciais à saúde e à segurança do trabalhador).

A Lei em comento, em seu artigo , acrescentou o parágrafo 5º ao artigo 71 da CLT, que trata do intervalo para repouso e alimentação, para dispor que no transporte coletivo de passageiros, os referidos intervalos expressos no caput (uma hora para trabalho que exceda de seis horas) e no parágrafo 1º (quinze minutos para o trabalho que não exceda a seis horas), poderão ser fracionados quando compreendidos entre o término da primeira hora trabalhada e o início da última hora, desde que previsto em convenção ou acordo coletivo de trabalho, ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais do trabalho, mantida a mesma remuneração e concedidos intervalos para descanso menores e fracionados ao final de cada viagem, não descontados da jornada.

O artigo da Lei 12.619/2012 traz alterações na Lei 9.503, de 23/09/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), para acrescentar os artigos 67-A a 67-D, tratando do tempo de direção ou de condução, assim entendido como sendo o período em que o condutor estiver efetivamente ao volante de um veículo em curso entre a origem e o seu destino (parágrafo 4º, do artigo 67-A) e dos períodos de descanso obrigatórios.

Tais alterações são necessárias para que a regra do tempo de direção ou de condução seja aplicada a todo e qualquer motorista profissional, seja ele empregado de empresas nacionais ou estrangeiras, bem como aos Transportadores Autônomos de Cargas, assim definidos pela Lei 11.442, de 05/01/2007, em seus artigos , inciso I e , parágrafos 1º e 2º.

De nada adiantaria haver alterações na CLT para tratar de tempo de direção e jornada de trabalho, obrigando apenas os motoristas profissionais empregados, deixando os milhares de transportadores autônomos de cargas sem a obrigação do cumprimento de um limite máximo de horas ao volante. Nesse sentido, dispõe o artigo 67-A do Código de Trânsito Brasileiro, com a redação dada pela nova lei, ser vedado ao motorista profissional na condução de veículos de transporte e de condução escolar, transporte de passageiros com mais de dez lugares e os de carga com peso bruto total superior a quatro mil, quinhentos e trinta e seis quilogramas, dirigir por mais de 4 (quatro) horas ininterruptas.

Dispõe o referido artigo, em seu par.1º, que deve ser observado um intervalo mínimo de 30 (trinta) minutos para descanso a cada 4 (quatro) horas ininterruptas na condução dos veículos anteriormente mencionados, sendo facultado o fracionamento do tempo de direção e do intervalo de descanso, desde que não completadas 4 (quatro) horas contínuas no exercício da condução.

Admite-se, em situações excepcionais e desde que não comprometa a segurança rodoviária, a prorrogação do tempo de direção por mais 1 (uma) hora, de modo a permitir que o condutor, o veículo e sua carga cheguem a lugar que ofereça a segurança e o atendimento demandados (par.2º).

Exige o referido artigo, em seu par.3º, que o condutor observe um descanso mínimo de 11 (onze) horas dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas, podendo ser fracionado em 9 (nove) horas mais 2 (duas), no mesmo dia. O descanso pode ser feito no interior do próprio veículo, desde que este seja dotado de locais apropriados para a natureza e a duração do descanso exigido.

O parágrafo 5º, do artigo 67-A do CTB traz uma relevante alteração que visa aumentar a segurança nas estradas, ao exigir que o condutor somente inicie a viagem com duração maior que 24 (vinte e quatro) horas, após o cumprimento integral do intervalo de descanso previsto no par.3º (11 horas de descanso dentro do período de 24 horas).

A nova lei define como início de viagem, para fins do previsto no parágrafo 5º, a partida do condutor logo após o carregamento do veículo, considerando-se como continuação da viagem as partidas nos dias subseqüentes até o destino.

Além disso, ela prevê a proibição ao transportador de cargas ou passageiros, embarcador, consignatário, operador de terminais, operador de transporte multimodal ou agente de cargas, permita ou ordene a qualquer motorista a seu serviço, ainda que subcontratado, que conduza o veículo sem a observância do repouso de 11 (onze) horas dentro do período de 24 (vinte e quatro) horas.

Lamentavelmente houve veto ao parágrafo 8º, do artigo 67-A que responsabilizava solidariamente com o transportador os agentes mencionados no par.7º, anteriormente mencionados, com exceção feita àqueles identificados como embarcadores e/ou passageiros, pelas obrigações civis, criminais e outras previstas em lei, decorrentes da inobservância dos horários de descanso previstos no referido artigo, ao argumento de que ao se estabelecer solidariedade na responsabilidade criminal a redação do par.8º é contrária ao princípio da responsabilidade pessoal, previsto no artigo , inciso XLV, da Constituição Federal. Desta forma, o par.7º ficou sem previsão de sanção em caso de descumprimento.

Dispõe o artigo 67-C que o controle do tempo de direção ou condução é responsabilidade do motorista profissional, respondendo pela não observância dos períodos de descanso, inclusive quanto às penalidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/1997).

Através do artigo , a Lei 12.619/2012 alterou a redação do artigo 145 do CTB, para incluir o parágrafo único para dispor que a participação em curso especializado previsto no inciso IV independe da observância do disposto no inciso III (não ter cometido nenhuma infração grave ou gravíssima ou ser reincidente em infrações médias durante os últimos doze meses).

Além disso, a Lei 12.619/2012 incluiu o inciso XXIII, no artigo 230 do CTB, para considerar infração grave e sujeita a multa e medida administrativa (com possibilidade de retenção do veículo), a condução em desacordo com as condições estabelecidas no artigo 67-A, relativamente ao tempo de permanência do condutor ao volante e aos intervalos para descanso, quando se tratar de veículo de transporte de carga ou de passageiros.

Por fim, em seu artigo 9º, dispõe a lei em exame que as condições sanitárias e de conforto nos locais de espera dos motoristas de transporte de cargas em pátios do transportador, embarcador, consignatário, operador de terminais, operador intermodal ou agente de cargas, aduanas, portos marítimos, fluviais, secos e locais para repouso e descanso, inclusive dos motoristas de transporte de passageiros terão que respeitar o disposto nas Normas Regulamentadoras do Ministério do trabalho e Emprego, dentre outras.

Embora não tenha sido prejudicada em sua essência, a Lei 12.619/2012 sofreu 19 (dezenove) vetos da Senhora Presidente da República, alguns absolutamente desnecessários, mas outros que prejudicam a viabilização dos repousos e demais benefícios trazidos pela nova lei ao motorista profissional.

Vale destacar os vetos aos artigos 7º, 8º e 10º, PL 99 de 2007 (n.319/09 no Senado Federal). O artigo visava a alteração do artigo 34-A da Lei 10.233, de 05/06/2001, que dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, para incluir o inciso VI, nos casos de concessão de rodovias, a exigência da construção de locais seguros destinados a estacionamento de veículos e descanso para os motoristas, situados a intervalos menores que 200 (duzentos) quilômetros entre si, incluindo área isolada para os veículos que transportem produtos perigosos, e em consonância com o volume médio diário de tráfego na rodovia.

O artigo trazia a relevante modificação no artigo , da Lei 11.079, de 30/12/2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública, para incluir o parágrafo 5º, afastando as vedações contidas no par.4º dessa última lei citada, quando a celebração e contrato de parceria público-privada tivesse por objeto a construção ou a implantação de pontos de parada em rodovias sob administração direta da União, dos Estados ou do Distrito Federal, para o estacionamento de veículos e descanso dos motoristas. Já o artigo 10 também obrigava a adequação dos contratos de concessões de rodovias outorgadas aos concessionários para que fossem construídos os estacionamentos de veículos, situados a intervalos menores que 200 (duzentos) quilômetros entre si.

A justificativa para os referidos vetos foi a de que a proposta acarretaria novas obrigações aos concessionários de rodovias, o que poderia ensejar o reequilíbrio dos contratos e o conseqüente aumento de tarifas cobradas nos pedágios, bem como a utilização do regime de parcerias público-privadas deve se limitar a projetos que exijam recursos vultosos e contratos de longo prazo, os quais permitam a amortização dos valores investidos.

Entendemos que a construção dos pontos de parada ao longo das rodovias, com estacionamentos adequados e com condições de higiene e segurança aos motoristas profissionais é medida urgente, tão importante quanto a definição de intervalos para repousos e limites de tempo de direção e jornada de trabalho, devendo integrar as ações e políticas governamentais do Estado, em nome da segurança nas estradas, cujo interesse está acima de eventuais reequilíbrios contratuais com a administração pública.

A Lei 12.619/2012 representa um avanço sem precedentes nas relações entre capital e trabalho e traz um novo regramento à profissão de motorista, contendo direitos e obrigações que deverão ser observados por todos os interessados.

Trata-se de uma lei que, antes de sua publicação, foi amplamente discutida entre as categorias econômica e profissional com a participação do Ministério Público do Trabalho e contando com o apoio de diversos parlamentares, o que eleva a responsabilidade na sua interpretação e aplicação.

*Narciso Figueirôa Junior é advogado, graduado e pós-graduado em Direito do Trabalho pela PUC/SP e assessor jurídico da NTC & Logística

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